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Brasil será uma “grande Venezuela”?

Um dos debates levantados pela extrema-direita nestas eleições é a campanha que uma vitória do PT poderia tornar o Brasil numa “grande Venezuela”. As notícias que correm dos nossos vizinhos, da imensa convulsão pela qual estão passando, não é novidade, principalmente sobre as crises de alimentação, economia parada, fuga em massa da população etc. A questão é: será que as políticas do PT realmente produziriam isto no maior país da América Latina? Ou ainda: a Venezuela é realmente tão ruim quanto ouvimos dizer?

O que é o bolivarianismo?

O bolivarianismo é uma proposta de governo que sustenta que os lucros da imensa indústria petroleira venezuelana devam ser repartidos com toda a população e não só com a elite. É fundamentalmente uma proposta de desenvolvimento que não se baseia nas teorias econômicas neoliberais e neoclássicas. Sejamos claros: não é comunismo nem socialismo. A propriedade privada é legal na Venezuela e investimento estrangeiro, apesar de sofrer algumas restrições, também o é, assim como o livre acesso à informação. O bolivarianismo pretende aumentar a participação popular por meio de conselhos populares – que não têm poder de mando, mas são estruturas mais formais para que as demandas populares possam ser ouvidas pelo governo.

Por que a Venezuela está numa crise tão profunda?

Em suma, porque a economia venezuelana se baseia, sobretudo, na extração e exportação de petróleo, cujo preço nos últimos anos caiu vertiginosamente. Para se ter ideia, em 2012, o barril custava em torno de U$$ 100; em 2016, esse preço caiu para menos de U$$ 40 e, atualmente, flutua em torno de U$$ 70. É fato que a política econômica do governo venezuelano manteve a dependência da exportação de petróleo para a maior parte da sua arrecadação ao invés de diversificar a economia, o que deixou o País menos subordinado à flutuação de preços do petróleo no mercado mundial.

A Venezuela depende de importar grande parte do que consome, como comida, mas sem uma grande arrecadação com a venda de petróleo, o governo acaba se endividando, sendo forçado a pegar dinheiro emprestado para financiar esse consumo. Tal dívida estrangula a economia, o que acaba piorando ainda mais a situação.

Contudo, não podemos colocar a culpa de tal situação no governo bolivariano, exclusivamente. Em uma situação de crise profunda, a resposta dos Estados Unidos e de todos os governos que lhe obedecem foi a imposição de sanções de todo o tipo e o congelando dos recursos venezuelanos fora do país, dificultando ou impossibilitando empréstimos, o que piorou ainda mais a conjuntura já bastante difícil. O embargo americano parece não ser nada demais, mas, na realidade, todos que querem realizar comércio com os EUA devem obedecê-lo, o que o torna quase universal. É praticamente impossível para a Venezuela conseguir crédito ou até mesmo pagar suas próprias dívidas, o que impede enormemente uma possível recuperação econômica.

Além disso, há indícios que o governo dos Estados Unidos tem financiado os movimentos de oposição – o verdadeiro elemento (interno) de desestabilização do governo venezuelano. Esse tipo de atitude é recorrente, tendo acontecido muitas vezes na América Latina: Brasil, em 64; Chile, em 73, e Argentina, em 76. O financiamento americano geralmente desordena os governos locais e a presença de armamentos supridos pelos americanos intensifica a selvageria enormemente, muitas vezes parecendo que o governo iniciou a violência, quando na verdade são grupos agitadores e imperialistas.

O ataque à Venezuela


Se, de fato, não podemos dizer que o governo Maduro é sem culpa, isso não significa que devemos aceitar com passividade o ataque desproporcional à Venezuela. Muitos países latino-americanos estão em condições financeiras e sociais terríveis, a exemplo da Argentina, do neoliberal Mauricio Macri, que está com uma inflação extraordinária; e das repúblicas da América Central, que têm taxas de homicídios extremos. Enfim, a situação venezuelana não é única. Porém, a imprensa nacional e internacional ataca a Venezuela como se fosse uma exceção à regra. Ou seja, a América Latina como um todo estaria vivendo às mil maravilhas, enquanto que a Venezuela seria o único país a enfrentar uma forte crise, resultado, principalmente, de uma espécie de “perversidade” ou “loucura” do presidente Maduro. Obviamente que há críticas a se fazer ao regime venezuelano, mas isso não significa “demonizá-lo”, tampouco justificar e apoiar a interferência do imperialismo norte-americano na região. Outro fato de grande relevância: Maduro é odiado pelas classes mais altas, mas continua popular com as classes baixas, o que explica a longevidade de seu governo mesmo sob ataques violentos.

Cabe ressaltar que mesmo com todos esses ataques, em pesquisa realizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), divulgada em 14 de setembro deste ano e tendo como referência o ano de 2017, a Venezuela está no 78º lugar no índice de desenvolvimento humano (IDH), um posto à frente do Brasil. Isso porque antes do aprofundamento da crise, a Venezuela tinha um pesado investimento em políticas sociais, como o “Movimento Somos Venezuela”, em que um efetivo de 86 mil jovens trabalhadores se encarregavam de percorrer o País para subsidiar, por via estatal, famílias de baixa renda com casas populares; cadastrar idosos que tinham direito à aposentadoria; ceder bônus para estudantes comprar uniforme e material escolar e distribuir cestas com alimentos subsidiados pelo governo. Estima-se que até 2017, mais de três milhões de famílias tenham sido atendidas.

Mesmo imerso em tão profunda crise, a Venezuela tenta manter as condições básicas para a sua população, como fica demonstrado nos dados do IDH. Se, no Brasil, com uma economia muito maior, houvesse o mesmo grau de investimentos em políticas sociais, certamente estaríamos muito à frente em relação às condições básicas de vida da população.

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