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Evolução do golpe rumo à ascensão da extrema-direita

A vitória do candidato de extrema-direita, Jair Bolsonaro (PSL), deixou perplexos uma parte da sociedade e vários setores da esquerda diante do fato tenebroso de se ver um fascista, apoiador da ditadura e da tortura, ascender ao poder através da manipulação do voto popular. A imprensa corporativa burguesa tratou o resultado do pleito como uma “vitória da democracia”, a fim de fortalecer a crença que o Brasil está sob “normalidade” democrática. Longe de ser uma “surpresa”, tal resultado foi o desenvolvimento natural das engrenagens golpistas que vêm trabalhando a todo o vapor no Brasil desde, pelo menos, 2014. Um fenômeno com características internacionais, inclusive.

As instituições democráticas burguesas não são um fim em si mesmo e sobre esse aspecto é preciso avaliar a ascensão do fascismo nas urnas por dois vieses. Primeiro, o numérico, que revela que a maioria do eleitorado brasileiro não apoiou Bolsonaro nas urnas (cerca de 90 milhões de eleitores brasileiros não votaram nele). Segundo, o da democracia burguesa como uma ditadura da elite econômica, de uma minoria sobre a maioria da massa de trabalhadores.

Sob esse segundo viés, é necessária uma retrospectiva dos passos seguidos pelos golpistas até aqui e a relação que as forças de esquerda tiveram com cada etapa deste golpe que culminou com a vitória de Jair Bolsonaro.

 

Reeleição de Dilma, em 2014

 

Sob uma intensa campanha promovida pela imprensa burguesa, que noticiava diuturnamente o julgamento do mensalão, escândalo midiático envolvendo o Partido dos Trabalhadores, Dilma Rousseff foi reeleita em 2014, derrotando o senador Aécio Neves (PSDB), numa acirrada disputa em segundo turno. Naquele momento, o antipetismo era o mote de todas as forças da direita em ação, capitaneadas, principalmente, pela grande imprensa, o judiciário e o PSDB que tentava voltar ao poder, apesar da forte rejeição popular.

O candidato tucano fez sua campanha anunciando que “libertaria o Brasil do PT” e da “corrupção” e, após sua derrota, teve início o “terceiro turno” das eleições, ou seja, a campanha orquestrada pelas forças imperialistas e privatistas para derrubar o governo eleito, uma vez que não foi possível impor tal derrota por meios “legais”.

Imediatamente ao resultado, o PSDB protocolou no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o pedido de auditoria da votação, além da cassação do registro de candidatura de Dilma e seu vice, Michel Temer. Pedido negado, a direita passou a se organizar com manifestações de rua, onde o germe do fascismo brotava através de pedidos de intervenção militar e outras pautas conservadoras. Um dos símbolos das festas coxinhas contra o governo Dilma foi um pato gigante, criado pela FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), em protesto contra o aumento nos impostos “patronais”. Isso sem falar da campanha misógina contra Dilma, a exemplo dos adesivos em que o rosto da presidenta aparecia em uma montagem no corpo de uma jovem nua, de pernas abertas, para ser colocado na entrada do tanque de combustível de automóveis. Do ponto de vista parlamentar, o governo foi travado de todas as formas.

Nos dois anos do segundo governo Dilma, fortaleceu-se a influência das Think Tanks, instituições que se dedicam a produzir e difundir informações que visam interferir nas decisões políticas. Um exemplo é o Instituto Millenium, a mais influente delas no Brasil. Patrocinado pelo imperialismo e pela burguesia pró-imperialista, o instituto é responsável por disseminar os preceitos neoliberais no País, principalmente no meio acadêmico.

Refém dos acordos firmados na campanha eleitoral, Dilma não conseguiu apoio popular suficiente para evitar o impeachment inconstitucional. O PT preferiu apostar nos acordos com o Congresso Nacional mais reacionário dos últimos tempos ao invés de mobilizar a população, nas ruas. O resultado foi a derrubada do governo através de um golpe, sem a necessária reação das massas que a elegeram. Michel Temer tornou-se o presidente.

 

O governo Temer

 

A partir das primeiras medidas do novo governo, o movimento “Fora Temer” ganhou as ruas e o usurpador conseguiu o título de presidente mais impopular do mundo. A crise violenta se expressou na maior Greve Geral realizada nos últimos anos pelos trabalhadores brasileiros, em abril de 2017, que tomou todo o território nacional, em protesto contra a Reforma Previdenciária, e na greve dos caminhoneiros, em maio deste ano, quando o valor do diesel atingiu patamares recordes, de acordo com os interesses das grandes corporações petrolíferas estrangeiras.

Mais uma vez, a capitulação dos partidos de esquerda e das entidades de luta se fez sentir e as reivindicações em torno do preço dos combustíveis, que colocaram em xeque a política entreguista dos golpistas, não foi utilizada como alavanca para agitar a população sobre as raízes do problema inflacionário e do seu empobrecimento, fincadas nesta política. Ao invés de apoiar a greve dos caminhoneiros, a burocracia ficou perdida no debate sobre o caráter da manifestação, se era lockout ou não, abrindo espaço para a direita, uma vez que em política não existe espaço vazio.

 

A prisão de Lula

 

Um dos pontos centrais da política golpista foi a prisão política do ex-presidente Lula, que já configurava como o escolhido do povo para assumir a Presidência da República. Mesmo com toda a campanha contra Lula, a candidatura do líder petista aparecia em primeiro lugar em todas as pesquisas de intenção de votos, com chances de vencer já no primeiro turno.

A prisão política de Lula ocorreu sem qualquer respaldo legal, uma das maiores fraudes jurídicas já vistas, um “circo” montado a mando do imperialismo para perseguir e atacar não só o PT, mas toda a esquerda e demais setores progressistas. Entretanto, mais uma vez, a política de Frente Popular do PT sucumbiu ao golpe e a revolta popular contra a prisão de Lula foi contida pelas burocracias sindicais e do partido que não organizaram mobilizações contínuas de rua, deixando de politizar os movimentos sindicais, estudantis e populares. Lula chegou a ser lançado como candidato, uma política acertada, não fosse o fato de a burocracia ter escamoteado no meio do caminho a luta por “Lula Livre”.

O PT abriu mão da candidatura Lula, acatando o golpe e lançou-se timidamente à campanha de Fernando Haddad, preocupando-se exclusivamente em manter seu espaço na política eleitoral.

Contudo, mesmo com toda essa megaoperação da burguesia e a capitulação da esquerda, a pressão popular se fez sentir e levou o nome de Haddad ao segundo turno.
Na reta final da campanha presidencial, o PT usou como estratégia desvincular o seu candidato do próprio partido (“Haddad não é PT”) e até mesmo a cor de sua bandeira (o vermelho) foi escamoteada. Lula desapareceu completamente da estratégia eleitoral petista.

 

Bolsonaro no segundo turno

 

A impopularidade do governo Temer e de toda a política dos golpistas, aliada à retirada do ex-presidente Lula do pleito e uma intensa propaganda anticorrupção e informações falsas nas redes midiáticas (aberta e fechada), criaram uma revolta que acabou por dar voz à política oportunista de Jair Bolsonaro com seus discursos anti-PT, anticorrupção e de apologia à violência como solução para uma suposta crise moral da sociedade.

Numa eleição marcada pela ausência do candidato preferido do povo, ausência de campanha, de debates e com escândalos de irregularidades não investigados, como o caso das fakenews e do caixa dois do PSL, Bolsonaro foi festejado pela imprensa corporativa como vencedor, quando, na verdade, não houve um processo eleitoral democrático.

As eleições foram pautadas pela agenda imperialista e seu resultado está diretamente relacionado com a crise econômica, sem precedentes, do capitalismo. A eleição de Bolsonaro veio coroar o golpe iniciado em 2014, cujos objetivos são ampliar a exploração da classe trabalhadora, entregar as riquezas nacionais para as grandes corporações estrangeiras, destruir os serviços públicos e acabar com as estatais para que todo o patrimônio construído com o dinheiro do povo salve da crise um grupo seleto de grandes empresários e banqueiros. Bolsonaro é apenas um “cão de guarda” do imperialismo, avisando que esses planos serão postos em execução, por bem ou por mal, contra os brasileiros.
 

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