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Entrevista com Gerson Teixeira sobre a “PL do Veneno”

O Jornal Gazeta Operária entrevistou Gerson Teixeira, engenheiro agrônomo e ex-presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA) sobre o Projeto de Lei (PL) 6299/02, conhecido como “PL do Veneno”.  A Lei dos Agrotóxicos, que está em vigor desde 1989, regula o registro, uso, produção, comercialização e o controle das informações disponíveis sobre os agrotóxicos permitidos no Brasil. Só para se ter ideia, no ano de 2017, o número de agroquímicos registrados bateu recorde: foram 277 compostos, sendo 161 deles os chamados Produtos Técnicos Equivalentes (PTE’s) – os famosos Genéricos, que segundo a ANVISA, nos processos de avaliação e registro de agrotóxicos, são os “produtos técnicos de diferentes fabricantes ou de diferentes processos de fabricação do mesmo fabricante considerados equivalentes se a avaliação do processo de produção usado, o perfil de impurezas e, se necessário, a avaliação dos perfis toxicológicos/ecotoxicológicos, atenderem os requisitos descritos no Anexo X do Decreto n° 4074 de 2002”. Esse aumento corresponde a uma alta de 374% em comparação ao ano de 2015, quando foram registrados 43 PTEs.

Jornal Gazeta Operária (JGO):   Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) 6299/02, apelidado de “PL do Veneno”. Do que se trata exatamente este projeto?

Gerson Teixeira:
  Esse Projeto, já aprovado na Comissão Especial, que foi criada para emitir Parecer sobre o mesmo, determina ampla flexibilização do uso dos venenos agrícolas no Brasil. Nos EUA, ainda na década de 1970 do século passado, os americanos tiraram do Ministério de Agricultura deles (USDA) a competência pelo registro dessas substâncias, transferindo-as para a Agência de Proteção Ambiental, a EPA. Eles fizeram isso em razão da forte influência dos ruralistas americanos sobre o USDA, exatamente como ocorre no Brasil.
O Substitutivo aprovado pela Bancada Ruralista, liderado pela deputada Tereza Cristina e pelo dep. Luiz Nishimori, faz o contrário. Em plena segunda década do século XXI, ele retira o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e a Anvisa da corresponsabilidade pelo registro dos agrotóxicos e empodera justamente o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) para essa finalidade.
O Projeto cria a autorização temporária para a liberação dos venenos. É o seguinte: caso o MAPA não efetue o registro de uma substância nos prazos sumários previstos pelo PL, esta estaria liberada até a posição final do órgão registrante. Então imagine que se chegue à conclusão que aquele produto não possa ser registrado por ser altamente cancerígeno ou por mutações genéticas, etc. Tarde demais, pois já teria sido usado.
Pela legislação atual, sendo observados efeitos do produto em mutação genética, câncer, alterações reprodutivas ou das funções hormonais e malformações fetais, o produto não pode ser registrado no Brasil. Isso acaba com o PL.
Em resumo, é surpreendente que os parlamentares ruralistas que utilizam os mandatos exclusivamente para aprovar Leis e medidas lesivas aos interesses da população consigam se manter em ampla maioria no Congresso Nacional pela vontade das suas vítimas.

JGO:   Quais os impactos que a "PL do Veneno" trará para os pequenos produtores e para a população no geral?

Gerson Teixeira: Pelo que descrevi acima, fica fácil prever o crescimento ainda maior do emprego dos venenos, incluindo os de maior periculosidade, pela agricultura brasileira. O resultado disso será inevitavelmente o aumento da incidência de vários tipos de câncer; a contaminação da água, ar, e do solo. Por suposto, a presença dessas substâncias no meio ambiente impacta o ser humano, afetando trabalhadores rurais, populações próximas aos locais de aplicação, pessoas em contatos com os produtos na indústria, comércio e transportes, além dos consumidores mediante o consumo de água e alimentos.
Gerson Teixeira: Quem está por trás desse projeto, qual a intensão de tais grupos e que interesses econômicos eles representam?
Sobre o “pacote dos venenos” é claro que estão por trás os interesses dos grupos transnacionais que monopolizam o comércio dos agrotóxicos e, associadamente, das sementes transgênicas. Internamente, os grandes fazendeiros são os maiores interessados, pois apostam nos efeitos da provável nova legislação na redução dos preços médios desses produtos. 

JGO:   Como os movimentos sociais, populares e sindical podem se organizar para enfrentar tal investida?

Gerson Teixeira:   As organizações ambientalistas e de defesa dos consumidores e da saúde pública, além das entidades de representação dos trabalhadores rurais tiveram uma atuação contra a aprovação desse projeto que deveria merecer o reconhecimento geral da população brasileira. Graças às denúncias e as reações por parte dessas organizações contra essa iniciativa desastrosa da Bancada Ruralista, juntamente com a atuação vigorosa de resistência pelo PT e outros Partidos como PSOL, PC do B, PSB e até de membros do PDT, foi possível a denúncia pública do PL, em larga escala, e isto certamente imporá dificuldades para a aprovação da matéria pelo Plenário da Câmara dos Deputados.
O importante é que essa luta continue; que as organizações permaneçam atentas e ativas e torcer para que consigamos mais adesões por parte de outras forças de representação da sociedade brasileira para impedir a aprovação final desse PL. E mais, torcer para no processo eleitoral do presente ano, os eleitores abram os olhos e não reconduzam para o parlamento Deputados com tamanha ousadia de legislar contra os seus interesses.

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