No último dia 13, com a retomada do controle da cidade de Alepo, segunda maior cidade da Síria depois de Damasco, o Exército Sírio conseguiu sua maior vitória desde o início da guerra civil em 2011. O conflito iniciou-se como uma revolta popular contra o governo de Al Assad, mas logo caiu nas garras do imperialismo e da reação da região que armou grupos “rebeldes” para derrubar o governo sírio e impor os próprios interesses num país de alta importância econômica, política e militar. De lá pra cá, com a fortes combates entre esses grupos e o Exército de Al Assad, apoiado pela Rússia, o Irã (Guarda Islâmica, principalmente as forças especiais, os Quds, e as milícias xiitas iraquianas), o Hizbollah (milícia libanesa xiita, próxima do Irã) e a China (por debaixo dos panos), a Síria ficou quase destruída, somando mais de 500 mil mortos e 5 milhões de refugiados.
Na quinta, 22 de dezembro, 4.000 combatentes “rebeldes” e civis que ocupavam Alepo desde 2012, deixaram a cidade depois que um cessar-fogo apoiado pela Rússia e pela Turquia foi confirmado em 13 de dezembro. Tratava-se do último grupo que mantinha o controle na parte oriental da cidade.
Esses “rebeldes” recebiam apoio do imperialismo norte-americano, França (Alemanha por trás) e Inglaterra, Arábia Saudita, Catar e Turquia.
Durante o governo de George W. Bush, a Síria foi associada ao ‘eixo do mal’– Iraque, Irã e Coreia do Norte –. A tentativa de tentar desestabilizar o País continuou nas administrações de Obama. A CIA conspirou diretamente com o serviços de inteligência de vários países aliados para embarcar armas e suprimentos. O que começou como programa clandestino dos Estados Unidos para derrubar Assad, transformou-se rapidamente em um programa de contrabando em larga escala através da fronteira da Turquia e da Jordânia, de armas, assim como treinamento e logística para a miríade de “grupos rebeldes”, incluindo a Frente al-Nusra (al-Qaeda na Síria) e o Estado Islâmico, que foi formada a partir da al-Qaeda no Iraque.
Paz na Síria, crise do imperialismo
Com a perda do controle sobre os rebeldes e a derrota da política dos democratas nas eleições dos Estados Unidos, a “paz” na Síria avança sob um acordo que tem no eixo a Rússia e a Turquia. O imperialismo norte-americano nem sequer foi convidado para participar das conversações em Moscou.
Para a Rússia, trata-se de manter a antiga aliança com a Síria e preservar sua base naval no Mediterrâneo, no porto de Tartus, usar a influência na região como moeda de troca em relação às sanções que lhe foram impostas a partir da crise na Ucrânia, usar a região como “show room” a venda de armas, disputar o mercado energético (com a passagem de gasodutos para o transporte à Europa) e o bloqueio do contágio da crise ao Cáucaso e o sul da Rússia.
O problema interno da Turquia está relacionado à tentativa de Erdogan em barrar o avanço dos curdos que ameaça a integridade do estado turco atual. A política do primeiro ministro Ergodan para conter a crise (que levou à lona as exportações têxteis) tem como eixo transformar o país num intermediário do transporte energético à Europa.
O governo turco busca negociar o bloqueio o grosso da ajuda aos “rebeldes” sírios, na contrapartida do bloqueio do apoio aos curdos pela Rússia e os próprios Estados Unidos. A formação de um estado independente no norte da Síria fortaleceria a luta pelo estado curdo na Província de Anatólia Oriental, majoritariamente curda, que ainda poderia se juntar ao Curdistão sírio.
As relações com o Irã também estão no eixo do desenvolvimento da situação política. Desde o levantamento das sanções contra o regime dos aiatolás, o comércio entre Irã e Turquia aumentou em 30%. O Irã tem interesse em barrar os curdos, que representam um problema interno, mas tem interesse em manter o governo aliado de al-Assad e em participar do Novo Caminho da Seda chinês, do qual a Rússia é um pivô, e que tem como objetivo agilizar o comércio entre a China e a Europa.
Sobre o acordo firmado em Moscou com a Turquia para estabilizar a Síria o principal fator, que chama a atenção, é que os Estados Unidos ficaram de fora.
A ofensiva contra a Síria e o desfecho do conflito civil favorável à Assad são mais alguns acontecimentos que revelam a crise monstruosa do imperialismo. Juntam-se a eles a vitória de Trump nos Estados Unidos, a extrema direita da Frente Nacional muito forte nas eleições de abril na França, o Brexit e favorecimento da extrema direita (principalmente o AfD) no cenário de enfraquecimento de Angela Merkel, na Alemanha, após o atentado de Berlim.
A Alemanha negociou com Erdogan 4 bilhões de euros para a Turquia bloquear a “invasão” de refugiados na Europa. Mas a Turquia, apesar de ser um membro da OTAN mantém interesses políticos próprios. O governo Erdogan tem interesse em se integrar ao Novo Caminho da Seda e à OCX (Organização de Cooperação de Xangai), liderada pela China e a Rússia.
Após a crise de 2008, a crise capitalista dificultou o controle das potências regionais pelo imperialismo. A Rússia e a China principalmente se fortalecerem. A Turquia e o Paquistão se distanciaram do imperialismo. A Arábia Saudita manteve sérias contradições com os governos Obama em relação com a política para o Oriente Médio e o petróleo.
A crise econômica está na base do aprofundamento da crise política. A implosão do Oriente Médio abala o componente mais importante do controle do petróleo pelo imperialismo. Neste sentido, a crise na região, que é periférica, enfraquece o centro do sistema mundial, que enfrenta a pior crise da história de pós-Guerra.
O capitalismo caminha para um colapso de gigantescas proporções. É a crise capitalista que colocará em movimento à classe operária mundial, principalmente nos grandes centros, após décadas de “sono neoliberal”.