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Incêndio em SP: uma tragédia anunciada e o modus operandi da direita

Na última terça-feira, dia 1º de maio, o desabamento de um prédio abandonado, no coração de São Paulo, o Edifício Wilton Paes de Almeida, tomou as manchetes de todos os jornais brasileiros. Ao que tudo indica, o desmoronamento ocorreu devido a um incêndio de grandes proporções, que teria se iniciado no 5º andar do prédio (que tem 24 andares) e se alastrou rapidamente. Segundo informações do Corpo de Bombeiros, o imóvel era ocupado por 146 famílias, totalizando 372 pessoas. Segundo Um inquérito da Polícia Civil afirma que o incêndio foi provocado por um curto-circuito em uma das tomadas.

O corpo de bombeiros segue fazendo buscas nos escombros em busca de desaparecidos. Até o momento, foram encontrados restos mortais de três pessoas: Ricardo Galvão, conhecido como "Tatuagem" que caiu do prédio no momento em que era resgatado pelos bombeiros, uma ossada aparentemente masculina ainda não identificada, e na manhã do dia 9 (quarta) mais uma ossada foi encontrada. O número de possíveis vítimas foi atualizado pelo corpo de bombeiros após um dos desaparecidos ser localizado com vida. O ambulante Artur Héctor de Paula, 45, que morava no prédio, foi encontrado na casa de familiares em Minas Gerais, informou a Polícia Civil. Com a confirmação, caiu para seis o número de desaparecidos. São eles: A faxineira Eva Barbosa e seu marido Valmir de Souza Santos, Selma Almeida da Silva e seus filhos gêmeos, Wendel e Wender, e Francisco Lemos Dantas.

Mas o fato é que essa foi uma tragédia anunciada, de responsabilidade única e exclusiva dos governos burgueses. De acordo com um laudo feito pela própria prefeitura de São Paulo, ainda em janeiro do ano passado, o edifício que pegou fogo “não reunia condições mínimas de segurança contra incêndio”. O documento de sete páginas foi base, inclusive, para o pedido feito pelo Ministério Público Federal, que enviou, ainda em 2017, uma recomendação à Superintendência do Patrimônio Público da União (SPU/SP), onde solicitava uma “reforma estrutural emergencial” no prédio do Largo do Paissandu. Tal solicitação nunca foi atendida.

Conforme apontaram os técnicos da prefeitura, a parte elétrica do prédio possuía “uma série de inadequações”. Isso sem falar na inexistência de extintor de incêndio nos dez andares visitados. Conforme escrito no laudo, “O sistema de hidrantes encontra-se inoperante, não havendo mangueiras e acessórios necessários a seu funcionamento”. O relatório descreveu ainda sobre a falta de condição de se escapar de um eventual incêndio.

Ou seja, o desabamento do prédio nada mais foi do que uma consequência natural de uma situação que já havia sido denunciada há mais de um ano e sem que nenhuma providência fosse tomada para evitar a tragédia. A Defesa Civil, prefeitura, governo estadual ou mesmo federal nunca tomaram qualquer medida no sentido de reparar emergencialmente o prédio e/ou alocar as pessoas em moradias temporárias.

Também não podemos ignorar o fato de que esse pode ter sido um incêndio proposital, uma manobra para, ao mesmo tempo, retirar as pessoas que ali moravam e comprometer a estrutura do prédio, já antigo. Com isso, o mercado imobiliário mataria “dois coelhos com uma cajadada”: desapropriaria várias famílias e faria a “higienização” do centro, contribuindo para o aumento exponencial dos valores de moradia na região.

Também chama a atenção que a tragédia ocorreu justamente no dia 1º de maio, momento em que estava organizada uma ampla mobilização dos trabalhadores para lutar contra as reformas e retiradas de direitos. A imprensa burguesa virou todas as atenções para o caso, deixando de lado as várias manifestações ocorridas pelo País, promovidas pela esquerda. Ocorre que incêndios desta natureza, ou seja, cujas vítimas são pobres, pretos, favelados e sem-teto são comumente ocultados pela imprensa, a não ser que sirvam a algum propósito maior. Só para se ter ideia, nos últimos 20 anos, segundo o documento “Limparam com Fogo”, do jornalista Conrado Ferrato, mais de 1,2 mil incêndios foram contabilizados nas periferias da capital paulista.  Entre 2001 e 2012, os bombeiros registraram nada menos do que 1.648 incêndios em favelas. Em 2016, foram 202 casos. Curiosamente, os incêndios sempre ocorrem em áreas valorizadas da cidade, cujo valor de mercado costuma subir 75% após os incêndios. Outro “mistério” é que as tragédias sempre acontecem à noite, dando cobertura a uma tática higienista e criminosa. Os burgueses, em busca apenas do lucro e da exploração, não se importam com as condições da população que, tendo suas casas queimadas, ficarão sem um teto.


Despejo e “gentrificação”


A política de despejo, higienização e gentrificação é nítida no centro da cidade de São Paulo. A gentrificação é um processo, cujo nome vem da nobreza inglesa, que implica em retirar as pessoas pobres dos bairros mais antigos, demolir casas, pequenos comércios e construir novas moradias com preços exorbitantes que apenas as classes mais abastadas podem pagar, isso sem falar na edificação de centros comerciais e shoppings, onde os pequenos comerciantes não têm condições de manter seu comércio sem elevar drasticamente o preço de seus produtos, abrindo caminho para o processo de especulação imobiliária.

O governo de João Dória (PSDB-SP), de caráter fascista e higienista, deu vários exemplos de como essa política vem se fortalecendo na capital paulista e, também,em várias capitais do País. A retirada, à força, dos moradores de rua e usuários de crack da chamada “cracolândia”; os espinhos concretados abaixo de pontes e viadutos espalhados pela cidade; a pintura da cidade com tinta cinza, apagando vários grafites e murais importantes, etc. são exemplos de medidas impopulares adotadas pelo tucano que retiram a mínima condição de vida que essa população já carente tem e marginaliza ainda mais a sua existência. Somente em São Paulo, maior cidade do País, segundo um relatório do Observatório de Remoções, 288 mil famílias, ou seja, mais de um milhão de pessoas correm o risco de serem despejadas de suas casas. Não por acaso, na maioria dos casos, os despejos são contra vilas, favelas e bairros com décadas de consolidação, próximos aos bairros nobres. Como justificativa, utilizam a desculpa da realização dos megaeventos (como no caso da Copa do Mundo e das Olimpíadas, no Rio de Janeiro, onde 22 mil famílias foram despejadas), o alargamento de vias (como na Avenida Pedro I, em Belo Horizonte) ou falsos processos de urbanização. Os desalojados são tratados da pior forma possível – na grande maioria das vezes não recebem auxílio, ou quando esse existe, é uma quantia irrisória, incapaz de suprir as necessidades mínimas para moradia.

Os grandes centros urbanos sofrem com vários problemas de infraestrutura. Incapazes de receber o contingente de pessoas oriundas do êxodo rural e de outros processos migratórios, suas periferias crescem a cada dia e não é incomum que prédios e casas abandonadas sejam ocupadas por pessoas e famílias em situação de rua.

Outro fator que vem aumentando drasticamente o número de ocupações urbanas é o encarecimento do custo de vida nesses locais. A remoção de pequenos comércios, casas antigas e a construção de grandes estruturas imobiliárias e comerciais contribuem para esse processo. Os governos burgueses higienistas, em sua tentativa de transformar os centros da cidade em locais de grandes lucros ao capital imobiliário, têm usado da gentrificação para este fim.


Pelo direito a um teto


O cerceamento de direitos ocorre em todos os âmbitos. O direito à moradia, estabelecido na Constituição Federal e na Declaração Universal dos Direitos do homem não são respeitados de forma alguma. Apenas o direito ao lucro é reverenciado e endeusado pelos burgueses e oligarcas do mercado imobiliário. A população que sofre com a superexploração do trabalho e com o desemprego, cada vez mais carente e marginalizada, enfrenta a negligência do Estado burguês, cuja função é garantir o lucro dos grandes capitalistas. Os governantes não se preocupam em assegurar as necessidades mais básicas do povo, desapropriando, pagando valores bem abaixo do mercado e deixando um contingente enorme de pessoas sem moradia

A especulação imobiliária é a face mais cruel da organização urbana moderna. Apenas uma revolução que exproprie os oligarcas imobiliários dos lucros exorbitantes conseguirá garantir as condições decentes de vida, educação e moradia para a população trabalhadora, acabando com as mazelas que afligem os proletários.

É preciso que os movimentos sociais de luta pela moradia se mobilizem contra os cortes orçamentários que impliquem em mais sacrifício à população de baixa renda. A regularização dos imóveis ocupados pelas famílias é um direito que somente será garantido por meio da organização dos trabalhadores.

Conforme apresentamos em outra publicação: as ocupações urbanas são a expressão da luta objetiva contra o processo de exploração capitalista. A crueldade capitalista precisa ser enfrentada pelos oprimidos e ocupar precisa cumprir sua função original que é, antes de tudo, o ato de lutar contra a exploração, o arrocho salarial, a opressão, a alienação, a discriminação, a desigualdade social.

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