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Alfabetização e inclusão social

Alfabetização e inclusão social

 

Apesar dos inúmeros estudos e pesquisas existentes na área da educação de jovens e adultos, o cenário educacional brasileiro ainda apresenta muita fragilidade, pois é detentor de um elevado índice de analfabetismo entre os jovens e adultos trabalhadores, seja no campo do letramento ou no campo funcional. Essa problemática é de grande relevância social e de responsabilidade do Estado brasileiro e suas instituições educacionais, sobretudo das instituições de ensino superior. Com base nessa realidade, é fundamental compreender que  a Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) não pode se furtar de estimular e acolher Projetos de Extensão que venham desenvolver em seus campi ações de alfabetizar e letrar os prestadores de serviços terceirizados nela existente.

É importante lembrar que a Educação de Jovens e Adultos no Brasil surge no contexto das lutas sociais e das desigualdades históricas no acesso à educação. Desde o período colonial, a alfabetização de adultos sempre esteve ligada às iniciativas pontuais e, muitas vezes, de caráter assistencialista e excludente. Mantendo esse caráter, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), criado em 1967, foi um dos principais programas de alfabetização de jovens e adultos durante o regime militar, criado com a concepção política de manutenção da ordem vigente.

Com base no pensamento de Paulo Freire, o MOBRAL foi funcional ao promover uma educação voltada para a adaptação dos trabalhadores ao sistema econômico e regime governamental ditatoriais, ao invés de buscar a conscientização que, para ele, nada mais é que sair de uma consciência ingênua para uma consciência crítica. O programa se limitava a ensinar a ler e escrever, sem dialogar com a realidade social dos educandos ou propor uma transformação social, isto é, restringia-se, apenas, ao sentido estrito da alfabetização que era o de decodificar o código escrito, reconhecendo as letras e reconhecendo o que estava escrito. Freire criticou o caráter conservador desse programa da Ditadura Militar de educação de jovens e adultos, afirmando que uma educação que se pretenda neutra, sem relação com as condições sociais e políticas, termina sendo uma educação que serve apenas à manutenção da ordem vigente.

Na década de 1960, Paulo Freire propôs um modelo revolucionário de alfabetização, centrado na conscientização e na transformação social, que ficou conhecido como o método Paulo Freire. Esse método buscava superar a visão bancária da educação, defendendo que a alfabetização deveria partir do universo vocabular dos educandos e de suas experiências.

Só na Constituição de 1988, a EJA (Educação de Jovens e Adultos) foi finalmente reconhecida como um direito público subjetivo, e a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) de 1996 reforçou essa garantia, prevendo a oferta de EJA como dever do Estado. Recentemente, aEJA “passou a ser compreendida como uma modalidade da Educação Básica dado o compromisso de reconstruir os conhecimentos escolares para aqueles a quem foi negado na fase da vida em que se espera que eles ocorram”. Necessário se fazer entender que a EJA é, principalmente, uma educação que deve incluir e desencadear transformações em níveis pessoal e social. A problemática da alfabetização de jovens e adultos trabalhadores no Brasil carrega consigo marcas profundas de desigualdade social e exclusão histórica. Apesar dos avanços legislativos e de políticas públicas voltadas à garantia do direito à educação para todos, ainda há, no nosso País, 11,5 milhões de brasileiros que  enfrentam o analfabetismo ou a baixa escolaridade, especialmente entre populações economicamente vulneráveis. Esses sujeitos, muitas vezes, trabalhadores informais, rurais ou empregados em funções precarizadas - como os terceirizados -, foram privados de oportunidades educacionais na infância e adolescência. Formalmente, a EJA surge, portanto, como uma modalidade essencial para reparar essas lacunas históricas, oferecendo mais do que acesso ao letramento: ela deve representar, de fato e de direito, uma chance concreta de inclusão, cidadania e transformação pessoal e social.

No entanto, o cenário oficial, como programa governamental, a EJA também é marcada por desafios significativos, como o abandono escolar, a falta de políticas de valorização e a escassez de programas adequados às realidades dos alunos adultos. A alfabetização de adultos exige metodologias próprias, sensíveis às trajetórias de vida e às experiências prévias desses sujeitos, rompendo com modelos escolares tradicionais e autoritários. A perspectiva baseada na obra de Paulo Freire valoriza, em sua essência, o diálogo, a escuta e a construção coletiva do conhecimento como as principais referências nesse processo educativo. Nesse sentido, ações educativas voltadas à alfabetização no ambiente de trabalho, junto aos terceirizados na UEPB, deveriam ganhar destaque ao promover educação em um espaço cotidiano, aproximando o saber formal da vida concreta dos trabalhadores.

É importante registrar que a educação é um importante caminho para a inclusão social, pois o mercado de trabalho é extremamente excludente. Ao permitir o acesso ao conhecimento formal, a educação pode ajudar a romper barreiras e a reduzir desigualdades. Além de capacitar profissionalmente, a oferta da educação escolar e a criação de condições para que se permaneça nela são direitos básicos da população que podem, quando possue um viés emancipador, promover o desenvolvimento de habilidades críticas, relativas a uma consciência sobre direitos e deveres.

Ao proporcionar acesso ao conhecimento científico, abrem-se caminhos para que indivíduos de diferentes origens sociais, econômicas e culturais possam dar sustentação ao desenvolvimento e transformações sociais. Dessa forma, a educação não apenas capacita para o trabalho, mas também pode fortalecer a autoestima e a autonomia, elementos essenciais para que cada pessoa compreenda as razões das desigualdades a que estão submetidas.

Em uma sociedade organizada pela linguagem escrita, a alfabetização é o primeiro passo para a autonomia, pois pode permitir que as pessoas compreendam e se posicionem no mundo de forma mais crítica e participativa. Ao oferecer essa oportunidade aos trabalhadores terceirizados, a universidade reafirmaria seu compromisso social e ampliaria seu papel como promotora de direitos fundamentais, mesmo que se manifestem as contradições nela existentes, como, por exemplo, a existência do trabalho precarizado entre seus quadros que também é composto por jovens e adultos não alfabetizados.

Muitos desses terceirizados enfrentam dificuldades para acessar informações básicas e exercer plenamente seus poucos direitos trabalhistas e civis, em função das barreiras impostas pela falta de domínio da leitura e da escrita. A educação de jovens e adultos trabalhadores, principalmente nas empresas privadas terceirizadas, em que as relações de exploração e opressão deixam os trabalhadores entregues à própria sorte, faz-se mais que urgente. Ela pode servir de ponte entre a necessidade de sindicalização ao criar uma unidade entre os trabalhadores. Ao investir em alfabetização, a UEPB também estabeleceria uma relação mais justa e solidária com os trabalhadores terceirizados. Por isso, o projeto de alfabetização com os trabalhadores terceirizados é não apenas necessário, mas urgente e transformador.

 

Foto: reprodução web 

 


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