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Trump promove guerra imperialista, não solidariedade à Bolsonaro

Os setores da economia que ainda se sentem prejudicados precisam sair da cômoda aliança com o imperialismo para não fazerem a classe trabalhadora pagar o preço da crise criada pelos políticos que apoiam.

A ameaça de imposição de uma tarifa de 50% sobre as exportações brasileiras aos Estados Unidos, anunciada por Donald Trump, não foi uma medida isolada de política comercial. Tampouco foi um gesto de “solidariedade” ao ex-presidente Jair Bolsonaro, como quer fazer crer a extrema direita brasileira. Trata-se, de fato, de uma tentativa de ataque direto à economia nacional, de pilhagem dos nossos recursos estratégicos e uma clara ofensiva geopolítica contra o fortalecimento dos BRICS, que emergem como alternativa concreta à dominação unipolar norte-americana.

Ao justificar o tarifaço, Trump evocou a condenação de Bolsonaro e de seus aliados golpistas pelo Supremo Tribunal Federal. É um argumento cínico, vindo de quem também tentou anular eleições em seu próprio país. Mas essa narrativa não passa de fachada ideológica: o verdadeiro alvo é o Brasil soberano, o Brasil que preside o BRICS, o Brasil que ousa inovar no sistema financeiro com o Pix e, principalmente, o Brasil que detém riquezas estratégicas cobiçadas por potências em declínio.

Estamos falando de recursos como o nióbio, do qual o Brasil detém 95% das reservas conhecidas no mundo, com produção superior a 207 mil toneladas em 2024, movimentando mais de R$ 1,1 bilhão. Os EUA, quarto maior consumidor mundial, não possuem nenhuma extração interna desse minério. O Brasil também é detentor da segunda maior reserva de terras raras do planeta, fundamentais para indústrias de alta tecnologia, defesa e transição energética. Quem mais controla esse mercado? A China. E é exatamente essa aliança sino-brasileira que os EUA querem romper.

Um fato que chama a atenção é que vários relatórios e fontes de notícias indicam que a China possui uma posição dominante na produção e refino de terras raras, com estimativas variando em torno de 70% para a produção global o que provoca crescente preocupação no Congresso norte-americano, como aponta o relatório do Congressional Research Service (2024). Enquanto Os EUA são o quarto maior consumidor mundial, atrás de China, Holanda e Coreia do Sul.

BRICS: a maior ameaça à hegemonia do dólar

O anúncio do tarifaço por Trump ocorreu logo após a bem-sucedida cúpula do BRICS no Rio de Janeiro, presidida pelo Brasil e focada em “fortalecer a cooperação do Sul Global”. Não é coincidência. Os Estados Unidos estão em pânico diante da perspectiva de desdolarização do comércio global, da criação de mecanismos alternativos ao SWIFT e da emergência de uma nova ordem multipolar.

Trump chegou a declarar que os países membros do BRICS deveriam automaticamente sofrer tarifa de 10%, pois “substituir o dólar é como perder uma guerra”. Essa é a confissão do medo: o medo de perder o poder de ditar as regras do jogo global, o medo da inevitável decadência do império. As mudanças em relação ao “tarifaço”, que deixaram a maioria dos produtos de exportação de fora, comprovam que ele age para promover instabilidades nas relações internacionais.

A cúpula do BRICS realizada em julho no Rio de Janeiro marcou o fortalecimento de um projeto geopolítico de integração do Sul Global, com novos mecanismos financeiros, acordos bilaterais em moedas nacionais e iniciativas de desdolarização do comércio internacional, como alternativa à ordem unipolar liderada pelos EUA.

Pix: um sistema que incomoda Wall Street e a indústria das criptomoedas

Outro alvo de fúria imperialista é o Pix, sistema brasileiro de pagamentos que já é usado por mais de 90% da população adulta. Enquanto a indústria financeira dos EUA cobra taxas abusivas e as criptomoedas fracassam em se tornar meios funcionais de pagamento, o Pix oferece agilidade, inclusão e custo zero.

Em entrevista à BBC Brasil, Paul Krugman, economista americano de 72 anos, que ganhou sozinho o Prêmio Nobel de Economia de 2008 por suas contribuições em um ramo da disciplina conhecido como "nova teoria do comércio", defende que o Brasil deve reagir com firmeza, inclusive com medidas de reciprocidade comercial. O economista classificou como “insana” a tentativa dos Estados Unidos de criminalizar o Pix — iniciativa que, segundo ele, está claramente motivada por interesses escusos das operadoras de cartão de crédito, como Visa e MasterCard, além do lobby da indústria de criptomoedas, todos aliados ao campo político trumpista. O sucesso do Pix representa uma ameaça direta aos lucros bilionários dessas empresas, ao eliminar taxas abusivas e ampliar o acesso bancário à população.

Mais do que uma inovação tecnológica, o Pix expõe a falência do projeto neoliberal das moedas digitais privadas, como as criptomoedas, vendidas como soluções “revolucionárias” que jamais cumpriram o papel de inclusão ou estabilidade. O Brasil ousou romper com esse modelo excludente e construir um sistema público, eficiente e gratuito de pagamentos. E, justamente por isso, passou a ser atacado: não por seus erros, mas por acertar demais fora da cartilha do império financeiro.

Além disso, o Pix representa uma afronta direta à hegemonia das big techs americanas, que historicamente operam como braços econômicos e ideológicos do imperialismo digital. Plataformas como Google, Apple e Meta — frequentemente aliadas a bancos e fundos de investimento — lucram com o controle de dados, o monopólio de meios de pagamento e a submissão dos países do Sul Global a seus ecossistemas fechados. A emergência de alternativas tecnológicas soberanas, como o Pix e as moedas digitais estatais em países periféricos, quebra o monopólio dessas corporações e mostra que é possível inovar fora do eixo do Vale do Silício. Por isso, a reação é feroz: tentam desacreditar, criminalizar ou capturar essas iniciativas. O Brasil, ao ousar mostrar outro caminho, se tornou um alvo preferencial.

O Brasil deve reagir com firmeza e não de subserviência

Krugman, que não é nenhum radical, foi direto: o Brasil tem pouco a perder e muito a ganhar se retaliar com tarifas proporcionais. Os EUA são apenas o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, atrás de China e União Europeia. E mais: as tarifas de Trump violam acordos internacionais, desrespeitam a OMC e transformam tratados em papel molhado.

Enquanto isso, setores da direita brasileira — inclusive o deputado “licenciado” Eduardo Bolsonaro — aplaudem o ataque estrangeiro, numa demonstração patética de servilismo. Estão jogando contra o povo, contra a indústria nacional e contra a soberania do Brasil.

Minérios estratégicos não podem ser moeda de troca para concessões ao império

Com reservas gigantescas de nióbio, lítio, manganês, bauxita e terras raras, o Brasil está na linha de frente da nova geopolítica dos recursos. Esses bens são estratégicos demais para serem negociados sem critério. E mais: a atual onda de flexibilização do licenciamento ambiental — aprovada no Congresso — abre as portas para a destruição dos biomas e a violação de direitos de comunidades tradicionais em nome da exportação bruta de nossas riquezas.

É inaceitável que as elites econômicas brasileiras se aliem a interesses estrangeiros para abrir mão do controle sobre esses recursos. O povo brasileiro não pode aceitar calado a entrega do subsolo nacional em troca de migalhas comerciais que beneficiam gente que sequer vive no país.

Trump, em sua campanha de retorno ao poder, tenta repetir a receita do “America First”, agora usando o Brasil como bode expiatório para seus fracassos internos. Mas não podemos permitir que o país seja empurrado para uma crise econômica fabricada por interesses estrangeiros.

O governo Lula acertou ao adotar uma posição altiva, mostrando que é possível reforçar os laços com os países do Sul Global, ampliar a cooperação com China, Rússia, Índia, África do Sul e os novos parceiros do BRICS. Os setores da economia que ainda se sentem prejudicados precisam sair da cômoda aliança com o imperialismo para não fazerem a classe trabalhadora pagar o preço da crise criada pelos políticos que apoiam. É hora da diplomacia se juntar à soberania popular. E é hora, também, dos movimentos sociais, sindicatos e organizações populares irem às ruas, não apenas contra as investidas de Trump, mas em defesa de um projeto nacional de desenvolvimento autônomo, tecnológico e ambientalmente responsável.

Os ataques de Trump não são só sobre Bolsonaro. São sobre tentar manter o Brasil ajoelhado. E a única resposta aceitável é levantar a cabeça, cerrar os punhos e dizer: aqui não!

 

Foto: pensar agro


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