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Greve no setor automotivo: grande vitória trabalhista nos EUA

No último dia 30 de outubro, aconteceu nos Estados Unidos o fim bem-sucedido da greve do sindicato dos Trabalhadores Unidos do setor Automotivo ("United Auto Workers", UAW), com conquistas históricas, e uma grande inspiração para toda a classe trabalhadora do País. A greve, que começou no dia 15 de setembro deste ano, após os acordos coletivos de trabalho anteriores expirarem, enfrentou as três maiores montadoras nos Estados Unidos: Ford, General Motors e Stellantis (uma união  entre a Fiat Christler e o Grupo PSA, mais conhecido sob o nome de Peugeot Citroën).

As causas para a greve foram múltiplas. O primeiro deles diz respeito aos lucros recorde das empresas, com bonificações inacreditáveis para os diretores executivos (CEOs) e acionistas. Entre os anos de 2013 e 2022, as três grandes montadores obtiveram 250 bilhões de dólares em lucros, com um crescimento em torno de 92%. Os salários dos CEOs aumentaram em 40% e 66 bilhões de dólares foram dispendidos como dividendos, sendo que só o CEO da Ford, James Farley, recebeu, em 2022, 21 milhões de dólares em compensação. Em contrapartida, o salário dos trabalhadores foi efetivamente reduzido em 19%.

Os lucros astronômicos foram, em parte, resultado de um acordo que os trabalhadores fizeram com as empresas em 2008, após a quebra da bolsa, no qual abriram mão de aumentos de salários e benefícios para tentar manter as empresas solventes, ou seja, com segurança de sobrevivência.  Essa solidariedade do “chão das fábricas” foi abertamente abusada e traída, e os recursos excedentes do acordo foram direcionados para o caça-níquel dos mercados de ações, sem nenhum ganho para os trabalhadores. Com a persistente alta da inflação nos EUA, os trabalhadores perderam poder de compra e se viram na necessidade de entrar em greve para garantir sua sobrevivência. 

Além disso, as montadoras têm utilizado cada vez mais a contratação temporária, que flexibiliza e reduz direitos trabalhistas. Com a recente iniciativa de transição para a produção de veículos elétricos (com subsídios gigantes do governo dos EUA, sem nenhuma prestação de contas), as montadoras têm criado empregos sem benefícios e com baixos salários, como na fabricação de baterias. Assim, a greve foi decretada para exigir reajustes salariais, o fim da precarização do trabalho temporário e uma transição para a produção de veículos elétricos que garanta a segurança financeira e de emprego para os  trabalhadores.  

O UAW adotou uma estratégia muito interessante na realização desta greve,  que se provou bem-sucedida. Ao invés de decretarem uma greve total dos 146 mil funcionários sindicalizados, eles optaram por declarar greves "em onda", mantendo, sempre, em torno de 46 mil funcionários paralisados. Assim, quando os gerentes tentavam remanejar a produção para uma fábrica cujos trabalhadores não estavam mobilizados, o sindicato  declarava greve naquela fábrica,  causando uma “dor-de-cabeça” sem fim para a gerência. A estratégia funcionou de modo a sempre manter as gerências incertas e incapazes de planejar sua defesa. Houve também grande solidariedade das comunidades em torno das fábricas, levando comida, mantimentos, fazendo companhia, etc.

As vitórias obtidas pelos trabalhadores foram significativas: aumento de 30% no salário (frente a uma oferta original de 9%). A Ford ofereceu um aumento de 25%, mais benefício para custo de vida, a transformação da maioria dos funcionários temporários em permanentes, além de aumento de salário para estes. A Stellantis se comprometeu a reabrir uma fábrica em Belvidere.  O movimento paredista também conquistou o direito a fazer greves contra o fechamento de fábricas, o aumento das aposentadorias e a promessa de investimentos em 8 bilhões de dólares para que estas fábricas não fechem.

O movimento paredista mostrou que os trabalhadores organizados conseguem dar respostas às crises sistêmicas, como a que passam os Estados Unidos e que os levaram à décadas de arrocho salarial e precarização das condições de vida. A pressão das bases sobre as direções sindicais foi fundamental para a adoção de uma nova postura do UAW, cujo atual presidente se elegeu em março por voto direto, pela primeira vez, com um discurso incisivo contra a situação criada pelos fabricantes. 
 


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