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Crie corvos que te comerão os olhos: PL das “Fake News”

Após três anos engavetado na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei (PL) 2630 de 2020, chamado de Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, mais conhecido como PL das “Fake News”, volta a ser incluído na pauta de votação do Congresso Nacional, mesmo estando cercado de polêmicas, conceitos generalistas, propostas no texto a serem regulamentadas posteriormente a sua aprovação e sem órgão disciplinador.

A princípio, a votação do projeto estava prevista para o início de maio do corrente ano. Porém o relator, Orlando Silva/PcdoB-SP, pediu que o mesmo fosse retirado da pauta, sob alegação de que seriam agregadas novas emendas ao texto original. Por outro lado, o governo Lula não tinha a segurança de sua aprovação. A aprovação desse PL tende a ser mais um teste importante para avaliar a capacidade do presidente Lula de formar uma base de apoio no Congresso.

O PL 2630 foi recolocado em pauta para ser votado pelos deputados na Câmara Federal, em caráter de urgência, e, se aprovado, passará a ser o marco regulatório da internet em vigor nas eleições municipais vindouras. O próprio nome de PL das “Fake News” se popularizou por ter um forte apelo na necessária luta contra as falsas notícias e informações, disparadas em massa, de forma arbitrária, sem qualquer filtro ou responsabilização das plataformas pelo conteúdo postado por internautas, ou robôs, através das mais variadas tecnologias. Estão sem nenhum controle social conteúdos de ódio, incitação a atos terroristas, à suicídio ou automutilação, à crimes contra crianças e adolescentes, contra o estado democrático de direito, disseminação de racismo, violência contra mulheres e todo tipo de violência política feita pela extrema-direita

São de conhecimento público em geral, e dos trabalhadores em particular, os embates e polêmicas suscitados em torno das “Fake News” utilizadas pela extrema direita, por meio das redes sociais, no último processo eleitoral. Campanhas baseadas em mentiras contra os candidatos do campo da esquerda, cujo alvo maior é Lula e, inclusive, contra o próprio processo eleitoral no que tange ao voto em urnas eletrônicas.

O tema é motivo de uma polêmica necessária diante da urgência para aprovação do PL 2630, que ganhou novo folego depois dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro. O uso das plataformas digitais na propaganda de longo alcance, questionando a segurança das urnas eletrônicas, que, supostamente, não garantiram um processo eleitoral ileso para a presidência do Brasil de 2022, serviu de combustível para a invasão dos Três Poderes, um movimento organizado pela extrema-direita fascistizada.

Na campanha eleitoral também se confirmou o poderio das grandes empresas de plataformas de Big Tech, como Google, Twitter e FaceBook. O uso de “click baits” (link clicável, formulado para atrair o usuário a uma página externa) e notícias falsas são instrumentos cada vez mais utilizados para manipulação do público. A revolução tecnológica e seu uso nesse campo fez as gigantes da imprensa chamada oficial, como Globo, SBT, Folha de São Paulo, Estadão, Veja, etc, perderem audiência e patrocínios, mesmo sendo disseminadoras, também, dos interesses da classe economicamente dominante que tem em suas mãos o controle da comunicação, principalmente a de grande alcance televisionada.

E, por conta dos interesses dessas grandes empresas de imprensa “oficial”, controladas por 6 famílias milionárias no Brasil, as contradições em torno do PL 2630 exige um debate profundo na sociedade. Uma delas diz respeito a proteção extra às postagens em redes sociais feitas pelos que exercem cargos políticos, como, deputados, senadores e outros parlamentares eleitos, que lhes garante o direito à imunidade parlamentar. De forma transversal, grandes são as divergências de opinião, inclusive no próprio campo da esquerda, sobre liberdade de expressão e as “Fake News”. A Constituição Federal, em seu artigo 53, diz que “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Essa condição visa garantir o livre exercício de opinião e posicionamento do representante eleito pelo voto popular. Parte da sociedade civil, inclusive entre a militância de esquerda, se coloca contra essa condição, mantida no PL 2630. No entanto, há que se entender que ao alterar tal regra constitucional, se permitirá ao Poder Judiciário que se coloque acima dos outros poderes instituídos, prejudicando o princípio da imunidade parlamentar, necessário para se evitarem perseguições políticas a representantes eleitos pelo povo.

Mas, mais inusitada e importante polêmica do projeto está presente no fato de que ele cria um fundo que pode transferir recursos da publicidade digital no YouTube para empresas consideradas oficiais, o que, para muitos jornalistas que trabalham na imprensa independente, prejudicará a mídia alternativa. Por outro lado, o projeto também garante uma blindagem extra aos conteúdos, que só poderão ser retirados das redes sociais caso tenham teor criminoso. O valor a ser pago às empresas que produzem notícias deverá ser negociado entre as partes interessadas, não há parâmetros previstos e o governo não terá controle. Um acordo comercial de “cavaleiros”. No Brasil, a maior beneficiária desse jabuti inserido no PL será a Rede Globo. Não há garantias de direitos autorais aos profissionais da imprensa e muita coisa dependerá de regulação futura. Essas grandes empresas, que vivem de concessão pública, terão, assim, ampliadas suas intervenções nas redes sociais.

O projeto abre a possibilidade de aumentar os lucros das grandes empresas jornalísticas, principalmente a Rede Globo, que sempre atuou como manipuladora da realidade apresentada à classe trabalhadora. Aqui está o pulo do gato! Ao invés de se combater “Fake News”, como todos esperam, o PL servirá para fortalecer ainda mais o poder da imprensa corporativa e rentista e sua propaganda neoliberal em favor da acumulação de lucros da grande burguesia. Dará mais poder para as grandes mídias se oporem, principalmente, contra os direitos dos trabalhadores e a favor dos governos neoliberais, ou seja, dos governos de direita. A grande imprensa tem lado na luta de classes, o lado dos detentores do poderio econômico.

A Rede Globo, a maior entre as demais, defendeu num passado recente, a ditadura militar no Brasil, participou ativamente do golpe contra a presidenta Dilma Roussef, em 2016, e foi a maior entusiasta da operação de “lawfare”, chamada de Lava Jato, que prendeu o presidente Lula para retirá-lo da disputa eleitoral em 2018 e levou à destruição da economia nacional. As narrativas presentes em suas programações estão cheias de desinformações, de conteúdos duvidosos, tendenciosos e recheados de mentiras. Esses meios midiáticos tradicionais são grandes difusores de “Fake News”, propagadas com roupagem de jornalismo profissional e democrático.

Se o PL 2630 cooperar para alimentar essa grande mídia, além do dinheiro público gasto em publicidade nesses canais de comunicação, aumentarão as chances de seu poder de propagação de notícias se voltar contra os governos do campo de esquerda, principalmente no atual momento de mudanças da ordem geoeconômica e política que se desenha no mundo, pois a imprensa rentista é completamente subserviente aos interesses do imperialismo ocidental, contra a soberania nacional e a democratização da comunicação.


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