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Conjuração Baiana ou Revolta dos Búzios

A Conjuração Baiana foi um movimento político popular que ocorreu em Salvador, Bahia, no ano de 1798. É também conhecida como a Revolta dos Alfaiates, uma vez que seus principais representantes eram os alfaiates João de Deus e Manoel Faustino dos Santos Lira, ou Revolta dos Búzios, pelo fato de que muitos dos ativistas que participaram usavam búzios presos a uma pulseira para facilitar a identificação entre si. A revolta foi composta, em sua maioria, por escravizados, negros livres, brancos pobres e mestiços, que exerciam as mais diferentes profissões dentro da colônia, como sapateiros, pedreiros, soldados, etc.

Influenciada por grandes revoluções que ocorreram em vários pontos do mundo, como a Revolução do Haiti, a Conjuração Baiana foi fortemente reprimida. Seus membros foram presos e, em 1799, os líderes do movimento foram condenados à morte, enquanto muitos outros que tomaram parte na revolta foram condenados a outras penas severas.

 

Contexto histórico 

 

Eram tempos de revoluções burguesas, influenciadas pelos ideais iluministas do século XVIII. Na Europa e nas Américas, levantes populares colocavam as monarquias em xeque e garantiam independência às colônias. A independência dos Estados Unidos da América, ocorrida em 1776; a Revolução Francesa, de 1789, e a Revolução Haitiana, de 1791, são exemplos de revoluções populares que influenciaram este levante no Brasil. Mas a principal influência foi a revolução no Haiti, onde o levante violento de escravos, liderados por Toussaint Louverture, filho de escravizados domésticos, contra colonizadores franceses, possibilitou que o país se tornasse uma República liderada por negros.
 
No Brasil não foi diferente. Os ideais da Revolução Francesa em defesa da liberdade, fraternidade e igualdade mexeram com as mentes e mobilizaram revoltas e conspirações em vários contextos. Minas Gerais e Bahia são exemplos de como cada local, levando em consideração seus interesses e conjunturas, interpretaram e lutaram por dias melhores. Nos últimos anos do século XVIII, mais precisamente 1798, Salvador não era mais a capital do Brasil, mas ainda era uma das mais importantes regiões coloniais das Américas e hegemonicamente mantida pela mão de obra africana escravizada e seus descendentes. A cidade portuária, abarrotada de gente, era povoada pela miséria, violência, desigualdade social e racial. Poucos brancos com muito e muitos negros com nada, era um barril de pólvora prestes a explodir em decorrência das desigualdades e hierarquias coloniais.

 

A Revolta

 

A Revolta de Búzios teve seu estopim no dia 12 de agosto de 1798. A cidade de Salvador amanheceu com 12 boletins afixados em locais públicos e de grande circulação de pessoas, convocando o povo à revolução. A trama conspiratória revelava que não eram poucos aqueles que se tornaram partidários do levante. Um boletim chamado de “Aviso nº 9”, declarava 676 membros no movimento. Os revoltosos, tomando como base os princípios iluministas, defendiam propostas democráticas, dentre as quais se destacam: abolição da escravatura, fundação de uma república democrática, eliminação do preconceito racial e defesa da dignidade na sociedade baiana, aumento do soldo das tropas militares, emancipação política em relação à Portugal e a liberdade de comércio com outros países.

Porém, a revolta não chegou a tomar as ruas. Ainda no dia 12 de agosto, as investigações tiveram início e um suspeito de ter produzido os boletins foi preso. No dia 22 do mesmo mês, dois novos panfletos tomaram as ruas, encontrados nas portas do Convento do Carmo. As investigações continuaram e, desta vez, levaram ao soldado Luís Gonzaga das Virgens, um dos líderes do movimento, que havia desertado das Forças Armadas, revoltado com o racismo no Exército e na sociedade baiana.
 
No dia 25 de agosto de 1798, o então governador da Bahia, Fernando José de Portugal e Castro, soube, através da denúncia feita por Carlos Baltasar da Silveira, que haveria uma reunião dos revoltosos no Campo do Dique do Desterro.  Essa reunião se tornou uma grande armadilha que culminou com a prisão de vários membros da revolta, inclusive seus líderes, o aprendiz de alfaiate, Manuel Faustino dos Santos Lira; o mestre alfaiate e dono de alfaiataria, João de Deus do Nascimento, e o soldado Lucas Dantas de Amorim Torres. Três participantes delataram a reunião e, da manhã do dia 26 de agosto de 1798 até o começo de 1799, foram efetuadas 41 prisões, sendo que 33 chegaram ao final do processo instaurado pela colônia.

A possibilidade da revolta instaurou um medo generalizado na colônia, sobretudo na Bahia. Uma Carta Régia do príncipe Dom João foi enviada, no dia 22 de dezembro de 1798, “exigindo sua imediata conclusão e a mais severa punição para os culpados da conspiração”. Quase um ano depois, em 05 de novembro de 1799, o Tribunal da Relação, ignorando os embargos do advogado de defesa dos réus, que alegava não haver “provas materiais” para sustentar uma condenação, emitiu a sentença condenando todos os acusados a variadas penas. Os castigos iam desde serem jogados na costa ocidental da África, fora dos domínios portugueses, degredo em Fernando de Noronha, à prisões que variaram de dez a cinco anos em Angola e seis meses em território brasileiro. No caso dos escravos, receberam 500 chibatadas no pelourinho e foram vendidos para fora da Bahia, sem direito a retorno.

Três dias após o acontecimento, os líderes da revolta, Manoel Faustino, Luís Gonzaga das Virgens, João de Deus e Lucas Dantas, que receberam a pena máxima, foram enforcados na Praça da Piedade e tiveram seus corpos esquartejados e expostos em locais públicos da cidade. Um ourives, chamado Luís Pires, também foi condenado a pena máxima, mas conseguiu fugir e jamais foi localizado.

A revolta dos búzios é mais um exemplo de que a luta do povo negro contra a opressão e a injustiça social existe desde o período da escravidão. Apesar da “mudança” dos tempos, a opressão, que atinge de forma mais brutal a população negra, é intrínseca ao sistema capitalista, e, por isso, a luta do povo negro por moradia, trabalho e melhores condições de vida se faz presente até os dias de hoje. O fim da sociedade baseada na exploração de uma classe sobre a outra, em nome do lucro acima da vida, é a única forma de acabar com as mazelas que assolam e oprimem a base da nossa sociedade.
 
 


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