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Bolsonaro veta projeto contra a violência à mulher

No último dia 10 de outubro, no Dia Nacional de Luta contra a Violência à Mulher, o presidente, Jair Bolsonaro (PSL), enviou ao Congresso seu veto ao Projeto de Lei (PL) que obrigava os hospitais das redes de saúde pública e privada a notificar à polícia os casos suspeitos de violência contra a mulher em, no máximo, 24 horas.

De acordo com o PL, a obrigatoriedade da notificação seria “para fins de estatística e prevenção", pois “o registro de violência contra a mulher no prontuário médico e o encaminhamento à secretaria de segurança pública pode, em médio prazo, servir de base para ações mais consistentes de prevenção a tais casos, pois, é necessário mapeamento preciso de tais ocorrências para melhor eficácia de qualquer medida”. De acordo com os apoiadores do projeto, o principal objetivo seria, portanto, criar mecanismos para proteger a mulher de nova agressão, ajudando a mapear as áreas com maior concentração de violência e reduzindo as subnotificações. Um dos argumentos utilizados para justificar a importância da medida é que "não existe por parte dos órgãos governamentais qualquer canal de comunicação entre hospitais e delegacias que mapeie as agressões de forma significativa, uma vez que, muitas vezes, a mulher agredida, por medo, deixa de registrar o Boletim de Ocorrência, mas procura um hospital devido às lesões”.

Bolsonaro, por sua vez, justificou que antes de tomar a decisão consultou o Ministério da Saúde e o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, este último sob comando da fundamentalista religiosa Damares Alves, e que ambas as pastas se manifestaram favoráveis ao veto integral. Hipocritamente, os ministérios alegam defesa dos direitos da mulher ao recomendar o veto sob o argumento de que “a proposta contraria o interesse público ao determinar a identificação da vítima, mesmo sem o seu consentimento, e ainda que não haja risco de morte, mediante notificação compulsória para fora do sistema de saúde, o que vulnerabiliza ainda mais a mulher".

As forças progressistas que atuam em defesa das mulheres devem atentar para o fato de que qualquer aumento do poder de controle e de repressão do Estado burguês sobre a população dificilmente servirá para proteger a classe trabalhadora, muito menos sua parcela mais vulnerável, as mulheres. Nas mãos de um governo de características fascistas, cujo machismo é público e notório, uma Lei dessa natureza pode virar letra morta ou mais um instrumento de repressão aos mais pobres. Ainda assim, o governo Bolsonaro teme aprovar a medida porque ela é fruto de uma reivindicação da luta em defesa das mulheres e representa, mesmo que de forma confusa, o fortalecimento da sociedade organizada.

Ao vetar a obrigatoriedade da notificação em 24 horas, a intenção do governo é incentivar o silêncio à violência contra a mulher, isentando o Estado que, teoricamente, seria responsável pela segurança da população, da tomada de medidas urgentes e graves. Sem ter em mãos os dados estatísticos que melhor precisem a situação, o governo se exime da obrigação da aplicação de políticas públicas assertivas, que serão cobradas da sociedade.

As mulheres vítimas de violência (seja física, sexual ou psicológica) se encontram em situação de extrema vulnerabilidade, condição que é utilizada pelos agressores para “calar” e impedir a denúncia. É preciso incentivar a quebra deste silêncio, que também mata. Porém, ao defender o veto, governistas argumentam que, ao garantir a notificação de forma obrigatória, o Projeto feriria a relação de sigilo entre médico e paciente, a autonomia da mulher, além de ter efeito contrário na subnotificação. Obviamente que o direito das mulheres de “escolher” se gostariam ou não de fazer a denúncia deve ser defendido.

Mas não é com essa defesa que um governo autoritário, e que faz apologia á violência, está preocupado.  Ocorre que quando uma pessoa é agredida, especialmente os grupos considerados de maior vulnerabilidade social (mulheres, crianças, idoso, portadores de deficiência etc.), a sociedade como um todo está sendo violentada: todas as mulheres são vítimas em potencial deste agressor. Portanto, a adoção de medidas contra os agressores não significa apenas assegurar a vida da vítima imediata, mas do direito de toda a sociedade de não conviver com esses criminosos.
Se o Estado democrático de direito realmente existisse na sociedade burguesa, o direito ou a liberdade individual não poderia se sobrepor ao direito coletivo e uma tentativa de homicídio, uma agressão ou violência seriam de caráter público. Ocultar o criminoso, ao invés de criar uma série de medidas públicas para dar segurança às vítimas, não impede a prática de outros crimes, inclusive com outras mulheres. A tendência é que ocorra justamente o contrário.

As mulheres precisariam ter garantias do Estado quanto a sua segurança e não o incentivo pelo silêncio. E essa garantia  significa a tomada de uma série de medidas, tais como: investimento em hospitais com atendimento especializado, acolhimento, casas de abrigo, atendimento psicológico, medidas protetivas, delegacias especializadas etc.

Mas, na sociedade de classes, o Estado representa os interesses da classe dominante e, quando sofre pressão da maioria, a classe trabalhadora age de acordo com a situação da correlação de forças do momento. O que estamos vendo na atual conjuntura política e social do Brasil é o aumento da investida do governo contra todos os setores marginalizados da sociedade, sendo as mulheres, negros, trabalhadores do campo e comunidade LGBTQ+ os setores mais atacados. Nesse sentido, o governo Bolsonaro se colocou hipocritamente contrário à aprovação de uma Lei que poderia aumentar os mecanismos de controle do governo sobre o povo, possibilitando ampliar a perseguição aos mais pobres e desprotegidos, não porque defende os direitos democráticos da população, mas devido à clara intenção de que a violência contra as mulheres seja ainda mais silenciada.

Para a classe trabalhadora interessa compreender que, sob governos de extrema-direita, não há a mínima possibilidade de se apostar em aprovações de Leis que ampliem o poder de repressão do Estado como solução para a defesa dos direitos democráticos. É preciso resistir e lutar contra todas as retiradas de direitos com os métodos da luta de classes. A violência contra as mulheres deve ser enfrentada nos espaços de organização dos trabalhadores através da luta contra o conjunto de ataques aos direitos democráticos da população.


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