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Onda de protestos na Argélia

Os eventos que ficaram conhecidos como Primavera Árabe, que ocorreram no Norte da África e no Oriente Médio a partir de 2010, estão sendo reascendidos na Argélia. Nas ruas desde 22 de fevereiro, os manifestantes já estão há mais de três meses de protestos interruptos, toda sexta feira. No último dia 2 de abril, a onda de protestos, somadas às pressões do Exército, levaram à renúncia do presidente Abdelaziz Bouteflika, antigo herói da independência do país e governante da Argélia por mais de duas décadas.

Tendo mantido o cargo na primeira onda de manifestações, Bouteflika se alinhou fortemente com os interesses dos países imperialistas da União Europeia, sobretudo a França, a quem deu apoio logístico em uma invasão militar no Mali, em 2013. A principal base aliada do presidente no país era o Foro de Empreendedores, formado em 2000, após a Guerra Civil argelina, que causou mais de 100 mil mortes. Esse grupo de capitalistas argelinos são estrategicamente aliados à burguesia francesa.

Porém, mesmo com a queda do presidente, as manifestações não pararam. Os manifestantes permanecem nas ruas mesmo em pleno Ramadã, mês que os muçulmanos (maioria absoluta da população argelina) jejuam durante o dia. Isso ocorre porque as autoridades que sucederam Bouteflika, como o presidente interino, Abdelkader Bensalah, ou o primeiro-ministro, Nureddin Bedui, e o general Gaid Salah, são fiéis ao ex-presidente. Desde a queda, os manifestantes continuam nas ruas exigindo o desmantelamento do sistema que governa o País há décadas, ou seja, um sistema completamente subserviente aos jugos imperialistas.

 

Violência policial

 

Os manifestantes vêm sendo duramente atacados pelas forças armadas da Argélia. No último dia 24 de maio, 14ª sexta feira de manifestações consecutivas, dezenas de manifestantes foram presos na Praça dos Correios, em Argel, capital do país. Mesmo com as detenções, milhares de pessoas continuaram nas ruas.

Casos de morte também estão sendo registrados. A Anistia Internacional denunciou o assassinato de Ramzi Yettou, 22 anos, espancado até a morte pelas forças policiais em 12 de abril, enquanto voltava para casa, situada à 20 quilômetros de Argel, após se manifestar na capital. Segundo a diretora-adjunta do departamento para o Norte de África e Oriente Médio da Anistia Internacional, Magdalena Mugharabi, em entrevista veiculada no Diário de Notícias de Portugal, “polícias atingiram violentamente Ramzi Yettou no crânio, causando ferimentos que teriam levado à sua morte”.

Além deste caso, no dia 28 de maio, o médico argelino e ativista pelos direitos humanos, Kamel Eddine Fekhar, morreu no hospital após 50 dias de greve de fome. Fehkar havia sido preso em 31 de março por ter dado uma entrevista em vídeo denunciando as Forças Armadas de praticarem violência e segregação contra a minoria étnica mozabita, berberes nativos do Norte do Sara que segue o rito ibadita do Islã, em Gardaia, cidade situada à 600 quilômetros de Argel. A morte do médico deu um novo impulso às manifestações. Em Bejaia, no próprio dia 28, milhares de estudantes marcharam em protesto em homenagem à Fekhar.

Como toda ação violenta das forças repressivas do Estado geram reações, o número de policiais feridos também cresce. Em Tinerkouk, cidade localizada a 800 quilômetros da capital Argel, pelo menos 24 policiais ficaram feridos em manifestações realizadas no dia 15 de maio.  A principal pauta de luta é contra o desemprego que assola o país e a manifestação foi levada adiante sobretudo por estudantes. Neste dia, os manifestantes chegaram a bloquear o acesso à câmara municipal e a confiscar equipamentos da imprensa.

 

Eleições adiadas

 

Mesmo com a onda de protestos, as maquinações do presidente interino, Abdelkader Bensalah, do primeiro-ministro, Nureddin Bedui, e do general Ahmed Gaid Salah para evitar novas eleições continuam sendo a tônica. Originalmente, as eleições deveriam ocorrer no dia 4 de julho. Porém, no dia 25 de maio terminou o prazo para apresentação de candidaturas para as eleições presidenciais. Nenhum candidato conseguiu atender as exigências do Conselho Constitucional, entre elas está a ordem de conseguir 60 mil assinaturas legitimando sua candidatura.

Belkacem Sahli e Abdulaziz Belaid, dois representantes de partidos de oposição ao governo provisório, desistiram de concorrer ao pleito no dia 24 de maio, com a alegação de que não tinham garantias necessárias de que suas candidaturas fossem analisadas pelo Conselho Constitucional de forma justa. Sem candidatos, as eleições serão automaticamente adiadas. E, certamente, a onda de protestos contra o sistema que governa o país há décadas, continuarão a todo vapor.

O que ocorre na Argélia é o exemplo da “bomba relógio” próxima a estourar em todo o terceiro mundo. No Sudão, rebeliões contra os preços altos de itens básicos e baixos salários ocorrem desde abril. No Marrocos, protestos de professores em busca de aumentos salariais e criticando a lei para professores substitutos levaram milhares de pessoas às ruas. Na América Latina, o fim de 2018 ficou marcado por manifestações na Argentina, Brasil, Chile e México pelos direitos das mulheres. No Brasil, nos dias 15 e 30 de maio, milhões de estudantes, professores e trabalhadores de diversas categorias protestaram contra os cortes do governo Bolsonaro nos investimentos em educação e contra a Reforma da Previdência.

O fato é que o momento histórico em que vivemos é de ebulição social da classe trabalhadora dos países que sofrem a dominação econômica e política imperialista. O capitalismo, para manter o lucro de uma casta de parasitas que dominam o mundo, aprofunda cada vez mais o neocolonialismo. Os trabalhadores, por sua vez, aumentam a revolta contra a exploração. Tal qual previsto na obra “Manifesto do Partido Comunista”, escrito por Marx e Engels em 1848, a burguesia continua produzindo seus próprios coveiros.


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