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Tese Mulheres

Nota do Conselho Editorial do Jornal Gazeta Operária

Nos dias 19, 20 e 21 de abril, em Belo Horizonte/MG, aconteceu o III Congresso da Luta Pelo Socialismo (LPS). Além da delegação mineira, o Congresso contou com a presença de militantes e simpatizantes de vários locais do País como Paraíba, Pará, Rondônia, São Paulo, Brasília, entre outros. O objetivo da atividade foi debater o momento político pelo qual o Brasil e o mundo estão passando, além de definir a política de atuação do Coletivo para o próximo ano.

O norteador dos debates foram as Teses apresentadas, que buscaram caracterizar a conjuntura atual em cada setor, além de definir os eixos de atuação da LPS em cada segmento, seu posicionamento e suas bandeiras de luta.

Disponibilizamos, na íntegra, as Teses apresentadas e aprovadas no III Congresso da LPS. Contudo, é importante destacar que, dada a rápida evolução do momento político atual, é possível que alguns fatos apresentados nos documentos estejam defasados, o que não retira a importância dos mesmos.

A todos, boa leitura e bom debate.


A situação das mulheres no mercado de trabalho


1. A entrada das mulheres no mercado de trabalho é por si só um agente revolucionário. A crescente presença das mulheres nas fábricas e indústrias provocou mudanças no cenário político. Contudo, historicamente, o patriarcado tem relegado às mulheres uma posição subalterna no mercado e reserva as posições com os piores rendimentos e os mais desvalorizados socialmente.

2. A burguesia perpetua a opressão socialmente construída sobre as mulheres nas sociedades modernas exatamente para manter sob controle metade da população. As práticas machistas perseveram por uma conveniência econômica fundamental ao sistema. Isso sem falar que, para a lógica capitalista, o fato de as mulheres engravidarem, por exemplo, e precisarem se afastar do emprego, mas continuar recebendo salários (licença maternidade), seria um “prejuízo” que tem que ser cortado.

3. Assim, considerando que as mulheres têm mais dificuldades de entrar no mercado de trabalho, são maioria no mercado informal e ainda enfrentam a diferença salarial em relação aos homens, mesmo exercendo a mesma função, elas, obviamente, terão maior dificuldade para se aposentar e mesmo manter seus empregos. É por isso que medidas como as reformas Trabalhista e Previdenciária, além da Terceirização Irrestrita, que representam a ponta de lança dos ataques do grande capital contra os trabalhadores, colocarão as mulheres em situação de ainda maior vulnerabilidade.


Ofensiva da direita fascista contra as mulheres


4. Com o avanço da direita fascista, as mulheres, negros, população LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros) e movimentos sociais, com destaque para os sem-terra, índios e quilombolas, por serem o elo mais fraco da classe operária, estão sendo cada vez mais atacados. Desde que essa “onda” conservadora, de extrema-direita, que levou ao poder o seu representante, Jair Bolsonaro (PSL), começou a ganhar força no Brasil, o número de assassinatos e as perseguições contra as “minorias” têm crescido assustadoramente.
5. Enquanto deputado, atuando desde 1991, a política defendida e votada por Bolsonaro foi sempre de ataques violentos contra essa parcela da população, sempre contrários aos interesses dos trabalhadores, em especial os das mulheres.

6.  Em 1993, por exemplo, Bolsonaro se colocou favorável à redução da licença maternidade de 120 dias (um direito garantido pela Constituição de 1988), além de defender que o tema referente a estabilidade da gestante deveria ser discutido em Lei Ordinária. Como sempre ocorre, o discurso utilizado para “justificar” essa barbárie é a de “lobo em pele de cordeiro”. Bolsonaro justificou a redução da licença maternidade como sendo uma suposta “preocupação” com as mulheres, que estariam sendo "ainda mais discriminadas" por ter direito aos 120 dias de afastamento. Ou seja, as gestantes é que seriam as responsáveis pela discriminação contra elas mesmas, assim como as mulheres que são estupradas foram as provocadoras, pois estavam “vestindo roupa curta”, “andando tarde da noite pelas ruas”, etc.

7. Assim, ao invés de combater os empresários que discriminam as mulheres e tentam burlar um direito previsto em Lei, o grande “defensor da família” pediu justamente o contrário: que as mães abandonassem seus filhos e que fosse arrancado das crianças o direito ao mínimo de cuidados maternos, tudo isso para garantir o lucro dos patrões, que na concepção patronal, deve ser priorizado até mesmo em relação à vida humana.

8. Temos ainda o Projeto de Lei nº 6055, de 2013, de autoria de Bolsonaro, Pastor Eurico (PSB/PE), Costa Ferreira (PSC/MA), Pastor Marco Feliciano (PSC/SP) e outros, que visa acabar com o atendimento obrigatório e integral às mulheres vítimas de violência sexual, por meio da revogação total da Lei n°12.845, também de 2013, sancionada no governo da presidenta Dilma Rousseff, que garante o atendimento obrigatório e integral dessas vítimas pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

9. Num país em que a taxa de feminicídio é a quinta maior do mundo e que uma mulher é estuprada a cada 11 minutos, segundo dados do Anuário de Segurança Pública, impedir o atendimento das vítimas de violência pelo SUS é um ataque atroz, principalmente para as mulheres pobres e negras, que além de serem as que mais sofrem com esse tipo de violência, são as que menos têm condições financeiras para buscar ajuda em outro lugar. Outra faceta desta triste realidade é a situação das profissionais do SUS, maioria são mulheres, que são ameaçadas de criminalização se prestarem atendimentos às vítimas.

10. Essa “onda conservadora”, no entanto, não passou despercebida. A campanha #elenão, contra o candidato Jair Bolsonaro (PSL), durante a campanha eleitoral, ganhou enorme repercussão em toda a sociedade e representou uma resistência contra a investida fascista da extrema-direita. Tal empreitada foi reflexo da forte rejeição, cada dia mais latente, aos setores da burguesia que compõem a ala da extrema-direita e que, dentre outras coisas, defendem a misoginia, o racismo, a homofobia, a tortura, o extermínio da população pobre e favelada, a xenofobia, a entrega do País aos monopólios internacionais etc.


Feminicídio e estupro: o que a sociedade capitalista reserva às mulheres


11. O resultado prático dessa campanha de ódio que a extrema-direita vem disseminando contra os setores mais oprimidos da população trabalhadora é o aumento de feminicídios. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a taxa de feminicídio no Brasil é a quinta maior do mundo - 4,8. O estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), constatou que no período de dez anos, entre 2006 e 2016, houve um aumento de 6,4% no número de assassinatos de mulheres – foram 4.030 mortes, em 2006, contra 4.645 execuções, em 2016.

12. No caso das mulheres negras, a situação é muito pior, já que além da motivação de gênero, há também a questão racial. O mesmo estudo do Atlas da Violência 2018 mostrou que a taxa de homicídios é maior entre as mulheres negras (5,3 mortes por grupo de 100 mil), do que entre as brancas, cuja taxa é de 3,1 – uma diferença brutal de 71%. Em relação aos dez anos analisados, os assassinatos de mulheres negras aumentaram em 15,4%.

13. Um levantamento feito pelo jornal G1, com base nos dados oficiais referentes a 2017, mostrou que, em média, 12 mulheres são assassinadas diariamente no Brasil, ou seja, um homicídio a cada duas horas.

14. Para 2019 o que se espera é o aprofundamento dessa situação. Apenas nas primeiras semanas deste ano (até o dia 03 de fevereiro), 193 mulheres foram mortas ou sofreram tentativas de assassinato por sua condição de gênero no Brasil. Em 34 dias, 126 feminicídios foram consumados e houve outras 67 tentativas com múltiplas vítimas, conforme dados do professor em Direito Internacional pela Universidade de São Paulo (USP), Jefferson Nascimento.

15. Com relação ao estupro, de acordo com um levantamento feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, publicado no jornal Folha de São Paulo, o Brasil registrou, em 2016, uma média de 135 estupros por dia. Já uma pesquisa feita pela Folha de São Paulo, em agosto de 2017, mostrou que o País registra uma média de dez estupros coletivos por dia e que as notificações dobraram em cinco anos.

16. A violência contra as mulheres faz parte de uma política que visa atacar mais da metade da população, mantendo esse importante setor aterrorizado e submisso. Esse é o “modus operandi” do Estado burguês. Não podemos guardar qualquer ilusão de que os aparatos da sociedade capitalista, a Polícia ou a Justiça, por exemplo, irão resolver esses casos de violência. Tais setores impulsionam e intensificam os ataques contra as mulheres, uma vez que a emancipação feminina não interessa aos capitalistas, que lucram fortemente com essa submissão. Somente a luta unificada poderá proporcionar uma mudança social real.


Aborto


17. Na sociedade capitalista, a proibição do aborto se relaciona com questões econômicas. Em plena revolução industrial, a proliferação do aborto passou a ser vista como um grave problema, pois diminuía a oferta da força de trabalho e, obviamente, os lucros dos capitalistas. Em 1869, durante o Papado de Pio IX, a Igreja Católica considerou o aborto como uma prática criminosa.

18. O fato é que o aborto existe e prospera em toda parte e nenhuma lei ou medida punitiva foi capaz de eliminá-lo. Assim, independemente de ser crime ou não, o aborto, na prática, é realizado. Trata-se de um grave problema de saúde pública, responsável pela morte anual de milhares de mulheres. Legalizar o aborto significa que o procedimento será feito de forma segura pelo SUS, obrigando o Estado a investir na área e em profissionais para dar um melhor acompanhamento médico às gestantes. Significa, também, que as mulheres poderão retornar mais rapidamente para seus postos de trabalho e que o Estado terá menos gastos com internações e cuidados futuros, provenientes de um aborto feito em condições insalubres.

19. Contudo, o avanço da direita contra os direitos democráticos das mulheres é tamanho que em novembro de 2017, uma comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou a chamada PEC "Cavalo de Tróia", Proposta de Emenda à Constituição 181/2011, que altera dois artigos da Constituição para definir que a vida começa na concepção. O texto foi aprovado por 18 votos a um e seguiu para o plenário, onde precisa de 308 votos, em duas sessões, para ir ao Senado.

20. A medida busca retroceder nos direitos já conquistados pelas mulheres e criminalizar o aborto em todas as situações, inclusive em casos de estupro, risco de vida para as mães e fetos diagnosticados com anencefalia, casos cujo aborto já é previsto pelas leis brasileiras. Isso sem falar na ameaça ao desenvolvimento da ciência como, por exemplo, o estudo com células tronco e os trabalhos com fertilização artificial.


Estado burguês a serviço da matança das mulheres


21. A negligência do Estado em dar a devida proteção para as mulheres que são ameaçadas e sofrem com a violência doméstica é uma política deliberada. Não existe segurança para as mulheres agredidas pela violência familiar. Não há abrigos e nem locais, em números suficientes, em que essas vítimas possam se apoiar. A Lei Maria da Penha é uma conquista democrática para a luta da mulher contra a violência, mas ainda não é o que pode garantir que vidas sejam salvas. Leis são criadas sob a pressão da sociedade organizada, mas o controle do Estado pela burguesia não permite que a legislação supere questões classistas.

22. Enquanto o Estado autoriza a matança das mulheres, a esquerda pequeno- burguesa está mais preocupada com questões “comportamentais” e “linguísticas” do que com a luta que realmente deve ser travada. A preocupação pautada nas liberdades individuais ou nas pequenas mudanças na língua para “incorporar” as mulheres, apesar de ter sua importância, não levará ao fim do feminicídio, tampouco irá reduzir o massacre e a opressão dessa parcela da população.

23. Para os marxistas, a causa fundamental de todas as formas de opressão é a divisão da sociedade em classes. Logo, a única forma de superar as opressões é por meio do fim das classes sociais. Nesse sentido, a luta das mulheres faz parte da luta de classes (explorados X exploradores). Essa é, portanto, a base da luta do feminismo operário.

24. A verdadeira emancipação das mulheres somente será possível quando a classe trabalhadora como um todo se emancipar. Somente o socialismo, em escala mundial, poderá permitir o livre desenvolvimento da personalidade humana, ou seja, o estabelecimento de relações verdadeiramente humanas entre homens e mulheres, sem as pressões externas, sejam sociais, econômicas ou religiosas. A LPS, embora reconheça a importância democrática do uso dos termos, discorda veementemente da ideia de que a opressão das mulheres poderá ser superada apenas com questões culturais como, por exemplo, falar “todos e todas”. Entendemos que não se trata somente de uma questão de “homens X mulheres”, concepção típica do feminismo pequeno-burguês, que busca ensinar as mulheres a lutarem por "causas femininas". A luta deve ser para que as mulheres trabalhadoras adquiram consciência de classe, única maneira de assegurar sua emancipação.

25. A luta não pode ser apenas pela libertação de um grupo, mas da própria humanidade. Tal concepção não impede, em absoluto, que se estabeleça uma verdadeira guerra pela conquista de direitos democráticos imediatos. Pelo contrário. É por meio da luta diária por avanços que a revolução socialista triunfará.

26. Mas, precisamos ter em mente que os meios de produção são propriedade privada dos grandes capitalistas. A mulher, seu corpo e sua vida estão à mercê desse sistema controlado pelo Estado, através de seu aparato repressor. Assim, o fim da opressão contra a mulher não depende da conscientização e nem de uma luta isolada. Essa situação só mudará, efetivamente, por meio de uma ação concreta, contínua, contra a opressão, que leve à mudança por completo do sistema econômico, ou seja, pela derrubada do capital e da implementação de medidas materiais que coloquem fim à exploração da mulher a partir da luta contra o embrutecimento doméstico.

27. Ante o exposto, reivindicamos: creches públicas, que atenda 100% da população; restaurantes públicos; lavanderias; inserção da mulher no processo de trabalho; saúde; educação públicas etc. A emancipação feminina está ligada diretamente com a emancipação da classe trabalhadora.


Propostas de atuação política da LPS para a questão de gênero


28. Ampliação da atuação do movimento de mulheres da LPS, através do Coletivo de Mulheres Luísa Mahin, compreendendo essa luta como parte intrínseca à luta proletária geral contra o capitalismo;

29. Realização de plenárias mensais para discutir as questões de gênero e tirar encaminhamentos para organizar a luta;

30. Lutar em favor das bandeiras democráticas das mulheres;

31. Estruturar a Secretaria de Mulheres para organizar um plano de lutas e atividades voltadas à questão de gênero;

32. Estruturar uma equipe para produzir materiais de denúncia, tais como: artigos para site, panfletos, jornais e revistas sobre a luta das mulheres;

33. Promover a formação teórica das militantes.

34. Contra a criminalização do aborto!

35. Trabalho igual, salário igual!

36. Creches públicas, nos locais de trabalho!

37. Pela libertação da mulher operária!

38. Pela revolução


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