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Compêndio de O Capital” – última parte

Finalizando o estudo sobre o livro “Compêndio de O Capital”, de Carlo Cafiero, publicaremos nesta edição a última parte do artigo, referente aos capítulos IX, X e a conclusão da obra.
O autor começa afirmando que a acumulação do capital é sempre nutrida com a mais-valia. Logo, sem a apropriação do trabalho alheio o capital nem existiria. Contudo, é preciso explicar a fórmula do capital, que se divide em duas partes: capital constante e capital variável.

O capital constante, explica Cafieiro, é representado pelos meios de produção e pelo material de trabalho – ele sofre um contínuo desgaste durante o processo. “O capital constante encontra-se, pois, reproduzido na mercadoria na mesma proporção em que foi consumido durante a sua fabricação. O valor consumido pelos meios de trabalho e pela matéria-prima é sempre exatamente reproduzido no valor da mercadoria”. Já o capital variável é representado “pelo valor da força de trabalho, isto é, pelo salário, e se reproduz também exatamente no valor da mercadoria”. Portanto, os salários pagos aos trabalhadores são produzidos inteiramente e incessante pelos próprios trabalhadores.

Portanto, tanto o escravo, quanto o servo e o operário trabalham uma parte para produzir a sua manutenção e outra para gerar o lucro de seu patrão. “A conservação do capital, a reprodução do capital, é, consequentemente, no modo de produção capitalista, a conservação deste vínculo de opressão e exploração humana”, afirma o autor. Assim, “acumular, enfim, é conquistar o mundo da riqueza social. Ampliar a sua esfera de dominação pessoal, aumentar o número de súditos”.

Outra consequência direta da acumulação do capital é a inutilização de um grande número de braços, isto é, a criação de um excedente de trabalhadores. De acordo com Cafieiro “a acumulação produz necessariamente uma superpopulação operária, esta se torna, por sua vez, a alavanca mais potente da acumulação, uma condição de existência da produção capitalista, integrada na sua lei de desenvolvimento. Esse excedente populacional operário forma um exército de reserva industrial, que pertence ao capital”. É essa população excedente que fornece a matéria humana “sempre explorável e disponível para a fabricação de mais-valia. É somente sob o regime de grande indústria que a produção de um supérfluo da população se torna uma mola regular da produção de riqueza”.

Esse exército, explica o autor, se divide em diversas categorias. “A primeira delas é a melhor paga, sofre menos com o desemprego e ainda executa um trabalho menos penoso; a última, ao contrário, é composta de trabalhadores que só esporadicamente encontram uma ocupação, que é sempre um trabalho vil, pago pelo mais baixo preço a que possa chegar o trabalho humano”. Essa última categoria é a mais numerosa, porque é composta de gente mais prolífera, com maior número de filhos. Assim, a pobreza forma, com a superexploração, uma condição de existência da riqueza capitalista.

Cafieiro explica que a lei na sociedade capitalista, “segundo a qual uma massa sempre crescente de meios de produção mobiliza progressivamente uma quantidade sempre menor de força de trabalho”, significa que “quanto maior a produtividade do trabalho, tanto maior a pressão dos trabalhadores sobre os seus empregos e, portanto, tanto mais precária sua condição de existência, ou seja, as condições para a venda da própria força para aumentar a riqueza ou a expansão do capital”. Disto conclui-se que “qualquer que seja o nível dos salários, alto ou baixo, a condição do trabalhador deve piorar, na medida em que o capital se acumula”. Trata-se da lei que mantém o exército de reserva (desempregados) no nível adequado às necessidades da acumulação e acorrenta o trabalhador ao capital. “É esta a lei que estabelece uma correlação final entre a acumulação do capital e a acumulação da miséria”, reforça o autor.

 

Acumulação primitiva


Cafieiro começa explicando que o operário, depois de ter gerado o capital com seu primeiro sobretrabalho, foi oprimido por um trabalho excessivo de uma jornada extraordinariamente prolongada. O tempo de trabalho necessário para sua manutenção foi encurtado pela mais-valia relativa, enquanto o sobretrabalho foi prolongando para nutrir sempre mais abundantemente o capital. “Na cooperação simples, vimos o operário submetido a uma disciplina de caserna, preso a uma corrente de concatenação de forças de trabalho, a extenuar-se mais e mais, para alimentar o sempre crescente capital. Vimos o operário mutilado, aviltado e oprimido ao máximo pela divisão do trabalho, na manufatura. Vimo-lo sofrer as indescritíveis dores materiais e morais, causadas pela introdução da máquina na grande indústria” etc.

Mas como isso foi possível? De modo muito simples, explica Cafieiro. O operário era dono de sua força de trabalho, contudo, lhe faltavam outros elementos indispensáveis ao trabalho – os meios e a matéria de trabalho. Ele, então, vê-se obrigado a vender seu único bem: a força de trabalho. “A propriedade industrial e o salário, fundamentos de produção capitalista, são a causa primeira de tanta dor”, afirma o autor.

A burguesia, num cinismo sem fim, tenta explicar a acumulação primitiva do capital como algo “divino” – você é pobre “porque Deus assim o quis”. Cafieiro, seguindo os ensinamentos de Marx, mostra que em épocas mais antigas, grupos de homens nômades, vieram a se estabelecer nas localidades melhor situadas e mais favorecidas pela natureza. No encontro desses grupos, surgem as guerras por sobrevivência. Tudo o que era vencido se tornava propriedade do vencedor, inclusive os sobreviventes, que se transformavam em escravos.  Essa é a origem da acumulação primitiva na antiguidade.

Na Idade Média, as invasões de povos e países era a regra. Tudo o que era dos vencidos passava para as mãos dos vencedores, exceto os sobreviventes, que não eram transformados em escravos, mas em servos. Já na época moderna, temos a revolução burguesa, que destruiu o feudalismo e transformou a servidão em salário, mas retirou, ao mesmo tempo, os poucos meios de existência dos trabalhadores. A burguesia “fez do servo um trabalhador 'livre', que não tem outro jeito senão se deixar explorar pelo primeiro capitalista que o captura ou morrer de fome”.

O autor encerra o capítulo afirmando que “a crescente necessidade de acumulação levou a essa gloriosa, moderna conquista da burguesia que é a fome. Um meio que é mesmo parte necessária para o funcionamento da produção capitalista como um todo; enfim, por si mesma, agindo sem grandes escândalos, sem grandes barulhos, é a fome um meio civilizado e honesto do mundo capitalista. E para quem se rebela contra a fome, há sempre mais espada e fogo”.


Conclusão

 

As conclusões que se tiram deste profundo estudo sobre a sociedade capitalista são:

1)    Que a propriedade privada é a fonte primeira de toda a opressão e exploração humana;

2)    Que a emancipação dos trabalhadores (a emancipação humana) não pode fundar-se em uma nova dominação de classe, mas no fim de todos os privilégios e monopólios de classe, e sobre a igualdade dos direitos e dos deveres;

3)    Que a causa do trabalho, causa da humanidade, não tem fronteiras;

4)    Que a emancipação dos trabalhadores deve ser obra dos próprios trabalhadores.

“Trabalhadores de todo o mundo, unamo-nos! Não mais direitos sem deveres, não mais deveres sem direitos! Revolução!”

Mas a revolução dos trabalhadores não é a revolução de pretexto. “Também a burguesia, como tantas outras classes, invocou um dia a revolução; mas tão somente para derrotar a nobreza e substituir o sistema feudal de servidão por esse mais refinado e cruel que é o do trabalho assalariado”, afirma Cafieiro. A revolução dos trabalhadores é a revolução pela revolução!
 


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